Tomei um susto hoje pela manhã quando vi meu rosto na primeira página do principal jornal de São Paulo. Bebi meu café olhando atentamente pra foto, pra me certificar de que era eu mesmo. Sabe como é quando a gente acorda!? Até a ficha cair... Lavei a cara umas 5 vezes pra não restar dúvida nenhuma. Ao abrir o caderno principal, lá estava minha ignóbil figura preenchendo quase toda a página da matéria. Difícil acreditar. Juro que nunca almejei isto, mas aconteceu. E quando eu menos esperava. A-con-te-ceu.
Quem me conhece sabe que não sou de brigas, mas já fui. A última briga foi pra defender um amigo que estava apanhando na porta do colégio de uns 4 caras enormes. Eu tinha 13 anos, ainda não raciocinava direito, então cai na besteira de querer ajudá-lo. Que merda! Dói só de lembrar a surra. Tudo pra tentar impressionar uma garota, que nunca mais vi. Mesmo fazendo muito tempo é inevitável não me recordar deste episódio quando vejo as marcas e cicatrizes que guardo de lembrança daquele dia. Devo admitir que por um lado foi bom, pois isto me fez nunca mais querer me envolver em brigas dos outros, ou melhor, em briga nenhuma. Também convenhamos, puta covardia. 4 gigantes contra dois franzinos. “Vai ser burro assim lá na casa do c...” – exclamo pra mim mesmo, frequentemente.
Hoje gosto de lutas esportivas e todo fim de tarde saio pra fazer uns treinos e levo comigo minha mochila gigante cheia de coisas. É longe pra cacete e sempre saio de casa no horário de pico de São Paulo. Tenho que enfrentar uma hora de viagem de ônibus lotado com a imensa mochila nas costas. É neguinho olhando feio o tempo todo. Um empurra-empurra fodido e eu e minha mochila lá. Sei que é foda, mas não tenho outra saída.
Ontem aconteceu a cagada toda. Busão transbordando, eu pedindo licença, todos colaborando e no fim do corredor, um cara de costas, ouvindo walkman, ocupando todo o corredor do busão. Fiquei atrás pedindo licença e o filho da puta não se moveu. Passei atropelando, dai ele vira pra mim e fala:
- Cara folgado... A mochila tem que passar primeiro sempre.
Fingi que não ouvi, exatamente porque não estava num dos meus melhores dias, insistente ele continua:
- Sempre tem um engraçadinho que quer ser diferente.
Quando ele disse isso o sangue subiu pela cabeça, mas procurei me conter pra não fazer besteira maior e só retruquei, igual criança mesmo:
- A mochila é minha e faço dela o que bem entender.
Ficou me olhando feio durante uns 5 minutos. Até então não havia me encarado ainda. Não aguentei e perguntei o que foi? Nem respondeu e veio pra cima direto com um cruzado. Me esquivei e já emendei uma voadora no seu peito que o deixou caído ali com os olhos bem esbugalhados e ofegante olhando pra minha fuça com cara de bosta. A cagada é que do nada apareceram mais dois caras que vieram pra cima com tudo. Fui mais esperto e antes da porrada deles me acertar, dei dois socos no nariz de um e um chute giratório na orelha do outro. Ninguém ficou em pé e o ônibus todo se pôs contra mim. Eu só estava me defendo, poxa. Quando eu vi que a chapa ia esquentar pro meu lado, tentei fugir por cima dos bancos pisando na cabeça de quem estava sentado. O ônibus tava em movimento e o cobrador logo percebeu que eu tinha gerado a desordem ali e quando eu estava pra saltar pela janela, ele conseguiu me segurar, mas provido de muita esperteza dei-lhe uma cotovelada no queixo que o nocauteou na hora.
O morfético do motorista que assistia tudo pelo retrovisor em silêncio, pra evitar que eu fugisse pisou fundo no acelerador. Irritado, caminhei sorrateiramente até ele e apliquei-lhe uma gravata, fazendo-o apagar e ai assumi a direção. Pra completar a minha sorte, logo a frente avisto uma barreira de carro da polícia, onde sou obrigado parar, pisando seco no freio, pra não fazer mais cagada. Todo mundo do ônibus veio parar na frente.
Os policiais invadiram o busão armados até os dentes. Perguntavam apenas onde estavam os filhos das putas. E os filhos das putas dos passageiros, apontaram pra mim, sem nenhuma hesitação. Os gambé nem quiseram ouvir explicação nenhuma e vieram pra cima feito boi bravo, se não fosse um dos policiais gritar lá do fundo:
- Achei os filhos das putas. Estão todos aqui no chão.
Acho que eu teria rodado bem. Todos os lazarento dos passageiros que quiseram me foder, agora em silêncio voltaram seus olhares admirados pra mim e começaram aplaudir. Palhaçada!!! Prefiro nem comentar nada. O chefe da polícia perguntou meu nome, apertou minha mão e me levantou no ombro. Puta mico! E um bando de micos ovacionando atrás. Uma multidão já me esperava na porta do ônibus. Repórteres, câmeras, fotógrafos. Flashes daqui e dali e essa putaria toda que fazem quando acreditam que alguém é importante. Não acreditava. Fiquei feliz, me senti um herói, me chamaram de herói. Parece que fiz algo bacana pelo menos uma vez na vida.
Quando a ficha começou cair tudo aquilo começou me encher o saco e pedi pra sair dali. Tenho um pouco de fobia. Que nada, sou misógino mesmo. Comecei correr e um monte de gente veio atrás. Que merda. Não consegui nem ir pro treino. Tive que voltar pra casa. Descobriram onde eu morava e ficaram a madrugada toda gritando na minha janela. Mandei todo mundo a merda e ignorei-os, achando que não fosse acontecer nada. Os vizinhos se assustaram. Depois de toda a loucura, quando tudo pareceu mais calmo, deitei e descansei. Olhei discretamente pela janela e tinha uns peças dormindo sentados na minha porta. Se foda! Quando acordei... Tudo pareceu só um pesadelo, mas quando olhei la fora de novo, vi alguns sujeitos se levantando e saindo dali, resmungando. Fui pra cozinha peguei o café abri o jornal e o que vejo? Essa semana to realmente fodido.