Ando correndo...
E Betita guardou uma parte de sua vida em caixas de papelão que estão empilhadas no banheiro do corredor da lavanderia. Ela segue assim. Armou uma cama num canto da sala e dorme lá, abraçada ao edredom que comprou em liquidação nesses varejos de roupas de cama de bairros de periferia.
Nunca mais vi baratas desfilando perdidas pelo banheiro do meu quarto. Aquela idéia de cobrir todos os ralos com pequenos tapetes comprados em lojas de 1,99 por 4,99 funcionaram. Aposentei o detefon, o insetizan e o baygon. E todos os outros tipos de veneno que Kafka achava bom.
Minúsculas formigas seguem em formação, vindo de um buraco da parede ao lado do exaustor até a pia melada com o resto de maltodextrina que derremei enquanto tentava encher uma garrafa pet de água.
E eu sigo assim... engatando a quinta no meu novo carro, sem antes passar pelas marchas anteriores. Ando atropelando pedaços de unhas de gatos enterradas no asfalto quente do meio-dia. Eu sigo, sem olhar as placas de sentido obrigatório, ou vire à esquerda na próxima esquina do paraíso (Metrô). Nem tão próximo de casa assim.
Por um vão da porta, sem alarde algum, observo Betita, conversar com Bob, porque ela virou um personagem de suas fantasias no seu mundo fantástico. É tão generosa que se permitiu lhe fazer companhia em seus devaneios. E percebo que os dias nem estão tão frios assim. As noites... não sei. Espero um ano de neve. Acordo suado na madrugada só de cueca e coloco o cobertor de lã sobre o chão, pois imagino que ele deve estar com muito mais frio do que eu. Só preciso de meias pra não gelar os pés.
Humberto, o porteiro trampou ontem até as 10 da noite, chegou em casa à meia-noite, acordou as 4 da madruga e às 6 da manhã já estava de volta ao trampo, sorrindo. Deve ser grato por ter um trabalho que não tem sido nada honesto com ele. Às 14h ele vai pra casa correndo pro dia seguinte chegar logo e ele poder voltar pro seu posto novamente.
Esperançoso, o sujeito.
E Betita penteia os cabelos de suas bonecas mal lavadas e roupas encardidas. Xinga-as e depois chora... e depois... ri... e depois... não tem depois.
Tem um sol à pino do começo de tarde. Tem flores mortas no jardim de dona Esperança. Um acidente com um motociclista logo ali, em frente à farmácia de manipulação. Um choro incessante de uma criança que ainda não deve ter almoçado, nem jantado ontem a noite e muito menos tomado o café de todas as manhãs perdidas em seus próprios pesadelos. Tem dona Angústia, pedindo pra ficar em casa mais uma noite. É óbvio que não a hospedei. Tem muita gente neste pequeno apartamento. Mas dei-lhe uma maça do amor, pra lhe trazer sorte e ela conseguir outro abrigo.
Ufa... acabei... pelo menos por hoje.
2 comentários:
é assim, pANKADA? Bom contexto e texto. Parabéns!
Que bom que o seu Blog existe... Quando quero uma boa leitura venho correndo pra cá ! Bjks TG
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