terça-feira, agosto 03, 2010

QUARTO

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Acordei em pânico. O quarto todo escuro. Desesperadamente procurei pelo interruptor e só os starfixes no teto eram visíveis. Por um instante pensei que estivesse perdido pelo espaço, quase abraçando estrelas, enquanto cometas lambiam minhas costas com suas caudas luminosas, mas isso não apaziguou meu medo. Chorei cada vez mais, e com toda a força que tinha no auge dos meus 7 anos de idade gritei atônito pela minha mãe.

Depois de muito estardalhaço ela abriu a porta, acendeu a luz e quando me viu aos prantos, correndo me abraçou. Perguntou o que era. Eu disse que sonhei que tinha sido abandonado pra sempre naquele quarto escuro. Abraçou-me mais forte e colocou uma das mãos sobre meus cabelos, onde senti os dedos enroscando nos cachos imundos e duros que tinha na época. Chorou comigo e disse que nunca me abandonaria. Peguei no sono novamente, deitado ali no seu colo, ouvindo-a ninar uma canção.

Exatamente 10 anos depois, parado no meio da rua, novamente com os olhos embargados, senti precisamente a mesma sensação daquela noite. Fiquei em estado catatônico observando o carro que a levava pro outro lado do mundo se transformando numa dessas miniaturas que coleciono na janela do meu quarto. Ela olhou pra trás, através do vidro fumê, com os olhos vermelhos e deu um leve aceno de mão. Virou-se rapidamente pra esconder possivelmente a única lágrima que segurou até então. Não sabíamos quando nos reencontraríamos e nem se isso iria acontecer um dia. Partiu com o seu marido e o outro filho pra uma nova vida lá na terra do Sol.

Não conseguia acreditar. Fiquei durante um longo tempo imóvel. Esperava que o carro desse meia-volta. Rezei pra que fosse tudo uma brincadeira. Voltei pra dentro de casa. A sensação era mais estranha do que a daquela noite. Não tava tão escuro e os starfixes no teto já não existiam mais. Não tinha ninguém, só um nó estranho parado na goela. Gritei tentando desatá-lo e tudo ecoou por aquelas paredes vazias. Só tinham me sobrado umas latas de sardinha e alguns ovos na dispensa. Segui assim... Diferente... Durante anos. Sigo assim, sem enxergar ao menos o resquício de uma curva nessa reta infindável.

Sem grana nenhuma, coloquei minha pequena mochila nas costas e sai por ai pedindo carona, atrás de sonhos. Passei por todas as padarias possíveis, mas não encontrei em nenhuma um sonho que saciasse o meu desejo de devorá-lo. E quando encontrava, as moedas que conseguia enfiar no bolso, não eram suficientes pra custeá-los. Demorei pra tê-los.

Com o dedão esticado na estrada, esperando algum forasteiro parar, pra me conduzir até um lugar perto do famoso velho oeste, que só tinha visto em gibis preto em branco, nas bancas de jornais do centro da cidade, eu criava canções e as cantarolava até o sol diminuir a sua luz atrás de alguma montanha ao sul do país. Criava amigos e inventava histórias. Imaginava novos contos e até arriscava poesias. E tudo passou, como o sopro do vento que um dia empurrou-me de volta pra mim.

Um dia ela voltou. Minha coroa. Não pra sempre, mas voltou. Quatro anos depois. A sensação conseguiu ser mais estranha ainda do que a da sua partida. Nem lembrava mais quem era e por isso partiu de novo por mais longos e longos anos, lá pro outro lado do hemisfério terrestre. Eu tentava localizá-la naqueles globos que o professor de geografia tinha em cima da mesa. Em vão.

Hoje ela já não está mais lá, mas parece-me muito mais distante ainda.

E o vento soprou e tudo passou. Ontem eu tava sozinho, tirei carteira de motorista e sai por ai. Hoje...

Me pego sorrindo, por míseros centavos.

As poucas mágoas que tenho vejo que não valem a pena e que hoje são só orgulhos imbecis. As merdas vividas naquele momento doeram, óbvio, mas sobrevivi e to aqui pra rabiscar esses contos, sem me importar se são verdadeiros ou não. Tudo pode não passar de uma mentira. E pouca importa se acreditam.

E continuo riscando o chão com pedaços de tijolos baianos. São riscos vermelhos. Desenho amarelinhas pras crianças do jardim de infância. E as mágoas não doem mais e não vejo motivo pra carregá-las. Agora sobra só o orgulho pensando que pode me proteger e que na verdade não serve pra nada, a não ser pra impedir-me de encontrar ou reencontrar um pedaço a mais da tal felicidade. Uma fatia da torta de banana que devoraria todas as manhãs, se tivesse.

E tudo passou com o sopro do vento e não sei se faria tudo diferente. Fiz o que teve que ser feito. Fiz o que me faz derrubar lágrimas hoje em dia quando lembro do quarto escuro e dos starfixes que nunca mais tive e da mãe que não me colocou mais no colo e nem cantarolou idiotas canções de ninar. “Boi da cara preta”, como sempre, a única e sempre presente em alguns dos poucos textos que escrevo. Ela não agüenta com meu peso, é isso. Ta bem velhinha.

E sabe aquele meio japa com quem andava de bike cross, antes de todos acordarem? Nunca mais o vi. É o outro filho da minha mãe, a quem mando cartas de reconciliação em aviõezinhos de papel.

E se eu tivesse uma nova chance... Será que faria tudo diferente? E o Paulinho? Faria?

Sem graça. Mais previsível do que isso, é impossível.

Vou dar um rolê em Marte ou Júpiter talvez, e amanhã...? Já to de volta.

6 comentários:

CL disse...

Considero isso tão triste quanto à minha separação de meu pai. No entanto, há dez anos que não posso ter esperança de reencontrá-lo. Só sobrou saudade!

PANKADA disse...

Saudade é sempre o que nos resta. E depois de um tempo vira um troço bom... uma sensação bacana. Histórias, histórias e histórias...

Maritta Cury disse...

Entre outras coisas, gosto de ti por sua sensibilidade! bjo bjo

PANKADA disse...

surpresa agradabilíssima você por aqui. beijo

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